10 anos do JB Online: uma história de sangue, suor e café
Memórias e aprendizado. Uma homenagem ao primeiro jornal brasileiro via internet
Nos meus primeiros meses no JB Online, em 1996, trabalhei de graça. Ainda estava na faculdade e fui apelidado, pelo Daniel Deivisson e pelo Roberto Ferreira, então redator e subeditor do primeiro jornal brasileiro na internet, de “estagiário informal”.
Eu achava aquilo ótimo. Só estar dentro do fantástico e mítico prédio da Avenida Brasil, 500 (hoje abandonado e depredado), caminhar por entre aquelas baias cheirando a mofo, furos de reportagem e neurônios brilhantes fritos por quase 300 pessoas em noites de fechamento e pescoção; só fazer parte do pioneiro jornal em um momento em que ele não era mais do que uma mambembe boa intenção; fazer parte daquilo que eu rapidamente descobri que seria o futuro, ao menos o meu. Só (tudo) isso já fazia valer a pena os perrengues por que passei. E o amor que aprendi a ter pelo Jornal do Brasil.
Naquela época, a infra-estrutura do JB Online se limitava a um surrado PC 386 (muitos de vocês nem eram nascidos quando 286s, 386s e poderosos 486 DX-2 66 dominavam o mercado). O site era cuidado por seu irrequieto criador, Sérgio Charlab, com quem tive pouquíssimo contato. Duvido que ele se lembre daquele estagiário informal cabeludo e cheio de brilho nos olhos.
O computador ficava no corredor. Isso mesmo. Nem sala o Online tinha. Sua atualização se dividia entre o turno noturno, que colocava o jornal propriamente dito no ar, e o incrível Extra!, que depois rebatizamos como “Tempo Real”.
A importância do café para a internet brasileira
Foi então que descobri a grande importância da indústria cafeeira para o desenvolvimento da internet brasileira. O velho 386 onde montávamos o JB Online no bloco de notas do Windows ou num editor de HTML furreca chamado HTMLWriter não tinha acesso ao sistema editorial da redação, que é de onde puxávamos as notícias obtidas por escuta, vindas de agências internacionais ou produzidas por nossos colegas de Agência JB.
É aí que entra o café. Como estagiário informal, uma de minhas atribuições era esperar algum jornalista se levantar para o inevitável cafezinho, correr, sentar em seu terminal de fósforo verde e jogar o maior número possível de notícias para um ambiente ao qual o bravo 386 tivesse acesso. Tudo isso antes do café do cara acabar.
Uma gincana. Entre um café e outro atualizávamos essa cobertura, nos primeiros dias do JB Online.
Depois as coisas foram melhorando, fui contratado, e os problemas ficaram ainda mais divertidos. Fizemos um concurso entre designers para reformular o site todo. O vencedor foi Carlos Benigno, profissional que acabou nos acompanhando por longos anos, dentro e fora do JB. Muito do que nós criamos entre 1996 e 1997 ainda está no ar. De resquícios da arquitetura de informação, a seções e alguns lay-outs.
A guerra do tempo real
Quando surgiu o Globo On, a grande diversão era descobrir quem colocava mais rápido as notícias no ar. E a briga era tão feia que tínhamos quase certeza que nossos “concorrentes” roubavam no horário. Isto é, publicavam às 17h uma notícia com hora de 16h30, e por aí vai. A briga não tinha limite, e nos levou a publicar notícias esdrúxulas como: “Caixão com Lady Di acaba de entrar na sepultura” ou “Fiéis choram no cortejo de Madre Teresa de Calcutá”. O Globo ainda dava uns informes de clima do tipo: “Tempo no Rio continua bom”. Muito divertido.
Outra loucura: na virada de 96 para 97 decidimos que era hora de mostrar a todo mundo que a internet não era habitada por seres verdes, feios e com longas antenas. Ora, nós não tínhamos antenas! Montamos então uma operação de guerra chamada “Caia na Rede neste verão”.
Esses homens fantásticos e suas webcams voadoras
A IBM cedeu alguns computadores e a Brasoft mandou uns jogos que, mesmo pra época, eram bem ruins. Mas era o que se tinha. Montamos então um cibercafé itinerante, que apresentou a internet e o JB Online para veranistas em diversos pontos do estado do Rio. Armamos o circo no hotel Marina Palace, no Leblon, em Búzios, em Angra dos Reis e em outros pontos do litoral. Em todos eles, outro bravo pioneiro, Marcelo Botelho, do Live in Rio, transmitia a 9.600 bps com seu celular analógico fotos tiradas com uma webcam. Lembre-se que celulares, mesmo analógicos, eram raríssimos. Coisa fina. E foram as primeiras transmissões ao vivo via internet, que incluíram um pulo de bungee jump e culminaram com uma cobertura em tempo real do reveillon de Copacabana, do alto de uma cobertura e com o notebook protegido da chuva por uns quatro guarda-chuvas amarrados uns aos outros.
Era uma internet bem diferente da que temos hoje. Mambembe, artesanal. Tão cheia de sangue, suor e neurônios como as baias desgastadas da Redação da Avenida Brasil 500. Mesmo que, no futuro, não haja mais um JB Online ou uma internet, como já não existe o prédio da Av. Brasil, há um brilho e uma contribuição que o tempo jamais apagará.
Enquanto estive no jornal, fui jornalista, editor, colunista, webdesigner, programador, webmaster e até comercial. Chegamos ao ponto de irmos a um cliente, vendermos o banner, criarmos a peça e aferirmos os resultados. Nestas horas, era comum o cliente dizer: “Adorei o banner. Mas será que posso fazer a pessoa clicar nele e ir pro meu site?”
Tudo estava apenas começando. Se pensarmos bem, ainda está. Feliz 10 anos, JB Online!
Artigo publicado em fevereiro de 2005 no JB Online/Jornal do Brasil.
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