Porradas e mistérios na velocidade da luz (ou não)
Bora para mais um compilado de leituras recentes? Nas últimas semanas, viajei mais rápido que a velocidade da luz, levei um soco no estômago com uma distopia brasileira (outra, não a que vocês estão pensando), li mais um clássico de Philip K. Dick que caiu em domínio público e fui transportado ao passado em um paradoxo. Para quem tem a assinatura do Kindle Unlimited, todos os livros são de acesso gratuito.
A Escuridão da Luz
Duas das histórias foram de companheiros no selo Saifers. Lançamento mais recente de Rogério Pietro (do excelente Horizonte Limite), “A Escuridão da Luz“ é uma novela hard scifi. Nela, uma sofisticada Inteligência Artificial brasileira faz uma descoberta que colocaria por terra décadas de consenso científico. Um especialista é convidado a conversar com a IA em busca de descobrir o que há de errado com ela ou com seu estudo (afinal, décadas de experimentos e postulados científicos não poderiam estar errados… ou poderiam?).
É uma narrativa que resgata vários experimentos e momentos-chave da Ciência mas que provoca um questionamento que não depende do entendimento das regras básicas da física e da cosmologia: será que até cientistas podem se agarrar às suas verdades como dogmas, pondo em risco o próprio método científico?
Idade do Mofo
Ainda dentro dos Saifers, fui tragado por uma narrativa que nos coloca no centro de um contexto onde o pior de cada ser humano é instigado a vir à tona. O cenário deveria ser familiar, o Rio de Janeiro. A desigualdade social, também, mas em um cenário de futuro próximo devastado pela mudança climática, poluição e outras mazelas, sobreviver pode ser tanto visto como fruto de uma incansável e indigna luta, como um castigo.
Não tem afago ou alívio cômico em “Idade do Mofo“, distopia de Vinícius Canabarro, autor carioca que vem se especializando em colocar, em suas páginas, monstros que surgem não do espaço ou de IAs malignas: os monstros brotam dos vizinhos, das pessoas ao redor, de nós mesmos.
A Cripta de Cristal
Outro conto de Philip K. Dick em domínio público, assim como “A Arma“, já resenhado aqui, “A Cripta de Cristal” é uma história policial que se passa em uma nave, a última embarcação a deixar Marte repleta de terráqueos às vésperas de uma guerra entre os dois planetas. A guarda local, no entanto, suspeita que três terroristas estariam a bordo. Escrito nos anos 50, o excelente conto não vai ter o mesmo rigor científico de outras histórias passadas em nosso planeta vizinho, o que não incomoda. Aos leitores, eu gostaria de chamar atenção à forma como PKD descreve os “Governadores” marcianos. Digam, por favor, se eles lembram outros personages de uma saga muito importante e querida.
Paradoxo
Esse foi uma ótima surpresa, principalmente pelas semelhanças com minha própria trajetória pessoal. Conheço João Carlos Rebello Caribé, o autor do conto “Paradoxo“, desde a virada do milênio, já com ambos mergulhados de cabeça no mundo pontocom, escrevendo sobre internet e trabalhando na área. Caribé seguiu no meio, tendo uma respeitada carreira acadêmica e, agora, também dá seus passos pela ficção científica. O aspecto autobiográfico é muito forte em Paradoxo, que nos leva para um estranho fenômeno temporal em plena pandemia de Covid-19, ao mesmo tempo que nos permite passear por uma parte da história da internet brasileira.
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